segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Breve História do Papado - I

No dia 11 de fevereiro, o Papa Bento XVI anunciou sua abdicação ao papado. Tendo em vista todos os comentários que esse evento gerou em redes sociais e na mídia eletrônica, logo pela manhã, iniciei uma breve pesquisa para me embasar em meus comentários a respeito do papado. Por isso, trago agora uma breve história e uma discussão tão profunda quanto meus parcos conhecimentos podem gerar.


Pedro, representado com vestes papais
O Começo

Já de início, temos que discutir o surgimento da figura do Papa. São Pedro é visto por muitos fiéis como o primeiro Papa, mas o problema é que não havia esse posto na época. Não há consenso acerca da hierarquia da Igreja Católica primitiva entre os historiadores. Há os que defendam que os líderes locais (apóstolos) não eram submetidos ao comando de um líder central, muito menos que ele estivesse situado em Roma. Existem mesmo defensores de que São Pedro nunca foi Bispo de Roma, nem mesmo esteve lá. A problemática surge porque os testemunhos da sua presença na cidade seriam todos de pessoas nascidas muito depois da sua morte. De qualquer forma, a tradição dessa história beneficiou em muito a legitimidade do poder eclesiástico durante o passar de Séculos.

Eu repudio o anacronismo. Refiro-me, aqui, a levar ao pé da letra o título de Papa. É óbvio que nada surge pronto, na sua forma final. O papa que conhecemos hoje é o resultado de mais de dois milênios de evolução do direito canônico. A igreja Católica de hoje não se assemelha em quase nada à igreja primitiva ou a poderosa igreja medieval, que constituiu exércitos numerosos e tinha grande poder político. Pedro foi um nome importante da Igreja Primitiva, senão o principal. Isso está nas escrituras. Se realmente ele foi sacerdote em Roma e foi essa "linhagem" que depois se tornou a principal entre todas, é possível dizer que ele foi um Papa primitivo, ainda sem poder absoluto. Assim como os reis da França feudal não detinham o poder dos reis absolutistas, mas são considerados reis da mesma forma.

O fato é que, naquele tempo, o Bispo não exercia uma autoridade sobre os demais fiéis. Os privilégios do Clero foram conquistados com o passar do tempo. Os primeiros cultos eram pequenos e familiares e o Apóstolo tinha papel de ancião, respeitável pela sabedoria, casado e com filhos. O patriarca de Roma, em especial, não possuía vantagem alguma sobre os demais, nem mesmo participou dos nove primeiros Concílios, a despeito do que retrataram muitos artistas, pagos pelos Papas na Idade Média para distorcer a história, assim como sustentaram a legitimação da sua linhagem no fato de Pedro ser o fundador da Igreja Católica. Esquecem eles que a Igreja era de Deus, não de Pedro: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha igreja". Não importa se você acredita ou não, a frase é de fácil interpretação e, em nenhum momento, dá a posse da igreja a Pedro, que é apenas instrumento, não edificador.


O Poder Eclesiástico

Imaginem um dúzia de pessoas reunidas para um culto. Essa era a cara das primeiras "missas". Foi quando o cristianismo ganhou proporções imperiais e o número de adeptos cresceu vertiginosamente que o desejo pelo controle do culto passou a gerar interesse. Os bispos passaram a delegar funções aos padres, primeiro sinal claro de hierarquia. No local do culto, a cadeira do Clérigo era mais elevada, para que ele observasse a todos. Depois a cadeira elevada foi substituída pelo trono.
Os direitos dos Bispos se reforçaram após o Concílio de Nicéia. Essa reunião era uma tentativa de Constantino em apaziguar as diferenças entre tradições de diferentes bispados. Nele foi decidido que Jesus era também Deus, estabelecendo a Trindade e o Credo e quem não concordou foi excomungado e condenado pela lei, pois os dogmas ali decididos passaram a ter respaldo legal do Império. A heresia era crime, punível pelo Poder Secular. Os discípulos de Arios tiveram de se refugiar fora dos domínios romanos e suas posses passaram para o clero.
Com o início da pressão bárbara, a capital se transfere para Constantinopla. É nesse ponto que se abre a brecha para a subida ao poder em Roma. A falta do imperador torna o Bispo a figura mais importante, inclusive em questões de jurisdição e na política. Teodósio, então, tornou o catolicismo religião oficial no Império, o clero passa a ser constituído por Oficiais do Império, com remuneração. Cresce o poder clerical. No princípio parecia ser um poder espiritual, mas o tempo viria a torná-lo um domínio sobre o corpo, as terras, a política e o mundo (inquisição, Estados Pontifícios, benção de reis e guerras, Tratado de Tordesilhas, respectivamente).

Constantino oferece coroa a Silvestre I, Bispo de Roma, que aqui preside o Concílio de Nicéia.
 Na verdade, São Silvestre nem esteve presente à reunião.

A decadência do império e de seus governantes é o portal maior para os sacerdotes assumirem controle na sociedade, sustentados na filosofia de Santo Agostinho, que dizia que o poder Secular não poderia governar. Apenas a Igreja pode criar a "Cidade de Deus". Obviamente, Agostinho não disse que deveria ser o Bispo de Roma que deveria governar, mas os Papas acrescentaram a ideia. É nesse ponto, sobre as cinzas da Roma pagã, que Carlos Magno é coroado com a benção do Papa, dando a inspiração para a posterior criação do Sacro Império Romano Germânico. Não só ele recebeu terras de um império, com o seu auxílio, o Papa se tornou uma espécie de Rei, com a aquisição os Estados Pontifícios. Interessante dizer que o título papal se popularizou e oficializou graças a uma inscrição no trono do Bispo de Roma. O "papa" da inscrição indicava, desde o Século IV, a ambição dos romanos em se tornar "pai dos pais", ou "padre dos padres".

Vale lembrar que, já nessa altura, os abusos de poder eram muitos. Muitos fieis descontentes migraram para monastérios. Mais uma vez, Agostinho favoreceu os clérigos. Dizia que não importava se o padre que lhe oferecia os sacramentos era pecador, ele era apenas um distribuidor e o sacramento agia por conta própria.

Carlos Magno é Coroado pelo Papa Leão III
Cisma do Oriente

Em 882, morre o primeiro Papa por envenenamento: João VIII. Pouco depois foi Formoso I, que teve o corpo excomungado, mesmo após a morte, arrastado pelas ruas de Roma e lançado às águas do Tibre pelo seu sucessor, Estevão VII. O furor do povo veio a trazer a morte deste também, durante uma revolta, pouco depois.
No Século seguinte, João X foi morto pela filha de uma amante, que conseguiu pôr seu filho no Trono de São Pedro, mas esse também foi assassinado anos mais tarde.
Só Bento IX assumiu três vezes o posto: eleito em 1032, deposto em 1044, restitui o poder em 1045 e abdica no mesmo ano. Reassume em 1047 para ser definitivamente retirado do poder um ano depois.

Durante esse período conturbado, a sede de Roma e de Constantinopla romperam e voltaram a se entender algumas vezes até que, em meados do Século XI, não foi mais possível o acordo e Constantinopla, com o apoio de todos os patriarcados do Oriente, rompe de vez com o Ocidente. Surge a ortodoxia. é o Cisma do Oriente. Pode parecer uma grande derrota para o papa, pois nesse período, muitos papas foram destituídos mas, na verdade, a ruptura ajudou a trazer sentimento de bipolaridade sobre o poder do Papa ou do Patriarca de Constantinopla. Foi mais um fator de centralização do Poder Eclesiástico.

Mesmo após o rompimento, em 1095, é declarada a primeira Cruzada, em auxílio aos Bizantinos e para a conquista da Terra Santa. Surgem, então, as ordens de cavaleiros e a inquisição. Muistas cruzadas se sucederam no passar de Séculos, mas nenhuma como a primeira.

CONTINUA...

Nenhum comentário:

Postar um comentário